Afinal, no seu caminho de Educação e Entretenimento, o que há por trás da história do Lá Dentro da Mata?
Acho que a pergunta que mais importa é se as histórias precisam trazer algo por trás. E, francamente? Não, não precisam.
Uma história pode ser apenas uma história e, por si só, ser especial. O que realmente importa é se ela consegue transportar o leitor ou ouvinte. Se a nossa imaginação viaja, a magia acontece e a história transforma. Mas, se no meio dessa viagem, pudermos abrir outras portas transformadoras, a experiência sempre poderá se multiplicar.
É sobre essas portas que eu quero lhe falar.
Quando comecei a criar o Lá Dentro da Mata para o meu filho, queria que ele tivesse maior contato com o universo das florestas brasileiras. O notável interesse que ele nutria pelos bichos era sempre atendido por brinquedos, histórias e documentários que, na sua grande maioria, tratavam dos fantásticos e gigantescos animais da fauna africana ou asiática.
Porta 1: A atenção à nossa fauna, tão rica, foi a primeira “porta” que conduziu a construção da história. Os animais das florestas brasileiras, embora não tão grandes como o leão, elefante, girafa ou hipopótamo, ou até mesmo pequeninos, são tão importantes e fascinantes quanto estes.
A partir daí, adicionei outro ingrediente: a tecnologia. Seria uma forma muito adequada ao presente, mostrar que artefatos tecnológicos podem ser grandes aliados das crianças da cidade no estreitamento da sua relação com a natureza. Mas, para além disso, quis falar sobre consumo e obsolescência tecnológica. Jururu foi a resposta, e já criou duas das nossas “portas” de uma só vez.
Porta 2: O uso da tecnologia para compartilhar aprendizagens e experiências enriquecedoras pode ser praticado com uma câmera e a internet. Especialmente em escolas, projetos multiplicadores podem reproduzir a missão de Jururu, mostrando experiências positivas das crianças com interações com o meio ambiente e boas práticas.
Porta 3: A descoberta do pequeno robô sobre ser útil, mesmo sendo ultrapassado é um bom ponto de partida para conversar sobre consumo com as crianças. A música de Jururu aborda essa questão de uma forma muito divertida.
Por outro lado, a vida mais natural é abordada através do alegre indiozinho, Poti. Ele ensina tudo sobre a floresta para o seu amigo robô e é um personagem elaborado para que possamos tratar das questões de diversidade étnica e da saudável relação que pode existir entre as crianças e a natureza.
Porta 4: Os dois livros frequentemente abordam palavras indígenas que foram incorporadas na nossa língua, e trazem, inclusive, um glossário dessas palavras no final. A compreensão da língua e da cultura indígena como matriz cultural brasileira é uma porta direta para fundamentar a noção de diversidade étnica na formação da criança.
Em contraponto às belezas naturais da floresta, logo no começo da história, Poti e Airy dormem na canoa, são levados pelo rio até a cidade e logo percebem que, por ali, os cheiros e os sons são muito diferentes.
Porta 5: Falar de poluição a partir do Lá Dentro da Mata é um caminho bem legal para facilitar a compreensão, especialmente porque, além da história tratar do assunto, a música “O Rio Levando a Canoa” tem uma sonoplastia em seu arranjo que possibilita a percepção da poluição sonora através da transição dos sons da floresta para a cidade.
Por falar em rio, é disso que trata o segundo livro, “No Caminho das Águas”. A viagem dos três amigos pelo rio, da nascente até a foz, traz uma série de informações legais sobre a riqueza e importância das águas.
Porta 6: O “No Caminho das Águas” aborda a geografia dos rios, a importância deles para a vida e os problemas que enfrentam, como desmatamento e poluição. A viagem na canoa é uma aventura de descobertas que pode ser detalhada à medida que a relação da criança com a história vá se tornando mais íntima.
Existem outras passagens para o conhecimento diluídas na história, mas acho que essas são as seis principais “portas perceptivas” (não, não são as de Huxley) que podem estender a ludicidade do Lá Dentro da Mata a uma experiência educativa. E, dessa forma, alcançamos esse conceito bem legal que convencionamos chamar de edutainment (educação + entretenimento, em inglês).
Bom, agora é hora de reinventar a sua leitura e contação dos nossos livros. Mãos à obra! E não esqueçam de me contar sobre essa experiência.
Um abraço e boa leitura.