A Volta da Ararinha-azul

Depois de rompimento de barragens,  incêndios na Amazônia e manchas de óleo no mar do Nordeste, estamos precisando festejar cada boa notícia sobre a nossa relação com a natureza. Uma, em especial, me deixou radiante, sobretudo por estar relacionada a um lugar pelo qual tenho enorme carinho: Curaçá, uma linda cidade no Sertão da Bahia.

Curaçá é muito musical e bem sertaneja. Daquelas boas de ouvir “causos” e uma viola em noite enluarada, na beira do Rio São Francisco, o rio que inunda a cidade de beleza, mitos e história.

Tem uma história recente, que se ouve na beira do rio, que é triste, mas parece estar perto de um final feliz. Ou, pelo menos, é pelo que a gente torce muito. É a história da Ararinha Azul.

Há 200 anos atrás, o zoólogo alemão Johann Baptist Ritter von Spix e o botânico Carl Friedrich Philipp Martius vieram para o Brasil com a missão de descrever a fauna e flora do país. Eles não estavam sozinhos. Traziam também a Missão Artística Austro-Alemã,  um grupo de artistas e cientistas que acompanharam a princesa Leopoldina, quando veio ao Brasil para se casar com o futuro imperador Dom Pedro I. 

Numa incrível aventura, Spix e Martius percorreram ao todo quatorze mil quilômetros, pesquisando e catalogando a flora, a fauna, o povo e os seus costumes. Dentre tanta riqueza registrada, estava uma das mais importantes do seu catálogo, a magnífica Ararinha-azul, batizada em homenagem a Spix, que a descobriu, como a Cyanopsitta spixii. 

Ao todo, a missão identificou  6.500 variedades da flora, 130 de anfíbios, 146 de peixes, 2.700 insetos, 85 mamíferos e 350  espécies de aves.  O conjunto foi a base da coleção do Museu de História Natural de Munique. A obra foi publicada com o nome de Viagem pelo Brasil 1817-1820. 

Depois dessa missão de descoberta, o Brasil passou por muitas missões exploratórias. Na busca por riquezas o território foi sendo transformado e a fauna, que foi objeto de estudo de Spix e Martius, tornou-se objeto mercantil. Não bastava conhecer, a exploração da terra trouxe também o estranho desejo humano de  capturar e colocar bichos em gaiolas.

A Ararinha-azul foi uma triste vítima desse processo. Em 1986 havia apenas um grupo de três aves identificado em Curaçá, em seu característico bioma de Caatinga.  Em outubro do ano 2.000, o último macho da espécie foi avistado na natureza. Nunca mais, desde então. Os céus do sertão perderam uma parte do seu azul.

Em 1990, o IBAMA criou o Comitê Permanente para a Recuperação da Ararinha-azul. E com um esforço incrível de pessoas incríveis, estamos diante da maravilhosa possibilidade de recuperarmos a existência de uma espécie no planeta. 

A instituição alemã Association for the Conservation of Threatend Parrots (ACTP) enviou para Curaçá, no dia 03 de março de 2020,  52 Ararinhas-azuis que foram abrigadas no Centro de Reprodução e Reintrodução das Ararinhas-Azuis. Lá elas serão preparadas para a reinserção na natureza. 

O processo não é fácil. Tanto que será realizado antes um “ensaio” com Maracanãs, espécie de hábitos semelhantes. Os biólogos irão monitorar as Maracanãs para tentar entender como as suas joias raras poderão se comportar. Só em 2021 deveremos ter a primeira soltura. Além disso, desde 2012, o Projeto Ararinha na Natureza atua na região, realizando pesquisas, políticas públicas de conservação da Caatinga e ações de educação ambiental. 

A ação é acompanhada pela comunidade científica de todo o mundo. Tanto assim, que o governo do Catar deverá assumir os custos do material escolar da rede pública de Curaçá por cinco anos, como ação de reforço à educação ambiental.

Nós, aqui do Lá Dentro da Mata, estamos torcendo e prontos para ajudar no que for preciso!

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